Nos artigos anteriores desta série sobre agilidade, abordámos vários temas relacionados com o desenvolvimento ágil de software e com o caminho que as organizações devem fazer, mesmo que não estejam diretamente relacionadas com desenvolvimento, para obter as vantagens e benefícios da aplicação de princípios de agilidade.

Também vimos que a agilidade nas organizações é uma questão cultural, de princípios e de valores, que não pode ser decretada e não se consegue reduzir a um conjunto de regras e procedimentos. Há, no entanto, um conjunto de ferramentas, entre as quais as reuniões diárias de acompanhamento, que ajudam a implementação de uma cultura de agilidade e que os gestores podem adaptar à realidade da sua organização.

Hoje vamos falar sobre desta prática essencial no desenvolvimento ágil de software denominada “daily stand-up meetings” (literalmente traduzido para “reuniões diárias em pé”), que pode ser facilmente adaptada para outras áreas de negócio.

Reuniões diárias de acompanhamento

As “daily stand-up meetings” são curtas reuniões diárias de acompanhamento que servem, não para dar explicações ou para justificar ao chefe o que a equipa anda a fazer, mas para partilhar entre todos os elementos da equipa o progresso de cada um e as dificuldades com que se estão a deparar.

A prática destas reuniões, feita de forma recorrente e continuada, introduz transparência no processo de trabalho, permite sincronizar pontos de dependência entre os vários elementos da equipa, focar nos objetivos mais importantes, identificar pequenas falhas que ameacem a eficiência da equipa e detetar problemas antes que tomem proporções difíceis de gerir.

Vamos aqui deixar algumas ideias sobre como podem decorrer as reuniões diárias de acompanhamento, para que possam ser lidas, interpretadas e usadas, sempre com uma grande dose de bom senso.

Assumimos a existência de um coordenador de equipa, que é o responsável por garantir o seu saudável funcionamento e o cumprimento das regras e dos compromissos com outras áreas e entidades.

Tentámos evitar deliberadamente a terminologia e as especificidades do desenvolvimento de software (como Scrum Master ou Sprint) para manter ampla a aplicabilidade das reuniões diárias de acompanhamento, como sugerido.

1. Todos os dias à mesma hora, no mesmo local, as mesmas pessoas

A criação desta rotina aumenta a transparência, melhora a comunicação interna e estimula a partilha de informação e a cooperação entre os vários elementos da equipa. O facto de ser à mesma hora, no mesmo local e com as mesmas pessoas reforça o facto de haver objetivos comuns a perseguir e a necessidade de manter o foco e a cadência de trabalho.

As reuniões podem realizar-se a qualquer hora, desde que seja sempre à mesma hora, de acordo com a conveniência da equipa, mas aconselhamos que sejam feitas de manhã, para marcar o início do dia. Na prática, verificamos estas reuniões têm tipicamente inicio às 9:45 ou às 10:00.

2. Mesmo com participantes remotos

Quando alguém não pode estar fisicamente junto do resto da equipa, deve mesmo assim participar na reunião, nem que seja por telefone ou por chamada vídeo. Isto é particularmente importante quando a equipa está geograficamente distribuída ou quando os seus elementos estão constantemente em viagem. É importante que ninguém da equipa fique de fora.

3. Mesmo sem coordenador

Pode acontecer que o coordenador esteja, ele próprio, impedido de participar na reunião. Mesmo assim, o resto da equipa deve garantir que a reunião acontece, à hora habitual, como ilustrado neste vídeo do Gary Straughan.

4. Ontem, hoje e o que me impede de avançar

Estes 3 tópicos (ontem, hoje e impedimentos) são os que dominam grande parte da agenda de uma reunião diária de acompanhamento.

Cada pessoa deve dizer o que fez ontem (entenda-se, desde a última reunião), o que vai fazer hoje e quais são as coisas que estão a dificultar a sua atividade.

Numa fase mais avançada, para organizações maiores e fora do âmbito deste artigo, uma pessoa pode não se representar apenas a si, pode representar uma equipa inteira.

Atenção a tarefas que se arrastam por mais do que 2 dias. Se alguém diz que o que estava a fazer ontem é o mesmo que vai estar a fazer hoje e disse a mesma coisa ontem, pode ser sinal que alguma coisa está a correr mal ou que a tarefa está fora do controlo. Para garantir que os atrasos face ao previsto são detetados atempadamente, é boa prática dimensionar as tarefas para que nunca tenham mais do que 2 dias de trabalho previsto e, se necessário, devem ser partidas em tarefas mais granulares.

A identificação de impedimentos, aquelas “coisas” que prejudicam o ritmo de trabalho, devem ser eliminados o mais rapidamente possível pelo coordenador do trabalho de grupo, sob pena de ter impactos sobre os objetivos previamente definidos.

5. Confiança no resultado

Por vezes alguns elementos da equipa são mais introvertidos, não tomam a iniciativa de falar para além do estritamente necessário, mas têm informação necessária para o projeto ou para a equipa.

Para evitar estas situações, como sugerido pelo Mitch Lacey, o coordenador deve ir além dos habituais 3 temas (ontem, hoje e impedimentos) e fazer uma pergunta direta a cada um dos elementos da equipa. Pode, por exemplo, periodicamente, perguntar algo como: “De 1 a 10, qual a confiança que tens no sucesso deste projeto?”. De acordo com as respostas, poderá ser necessário ir um pouco mais a fundo na análise, mas assim evitam-se comentários como “Eu já sabia que isto ia acontecer” depois do desastre, vindo de alguém que sabia, mas não disse nada e ninguém perguntou.

6. Curta duração

Uma reunião deste tipo nunca deverá exceder os 15 minutos, tempo suficiente para toda a equipa participar. A pressão de uma duração máxima torna as intervenções mais objetivas e a reunião mais eficiente.

7. Todos em pé

Estar de pé durante a totalidade da reunião não nos deixa cair numa situação de conforto, o que ajuda a manter o foco e a objetividade dos temas discutidos e marcando a diferença para as tradicionais, longas e lentas reuniões que nos sugerem improdutividade. Ah, e estar uns minutos de pé faz bem à saúde.

Esta sugestão, de estar em pé durante a realização da reunião, também é aplicável, e pelas mesmas razões, a elementos da equipa que entrem por contacto telefónico ou vídeo.

8. Mãos ao ar

É relativamente frequente (e incorreto) que se entre em detalhes do projeto, em justificações e em discussão de temas acessórios, o que pode resultar em reuniões longas e improdutivas. Quando alguém da equipa se apercebe que a discussão está a sair do âmbito estrito da reunião diária de acompanhamento, deve sinalizá-lo, levantando a mão.

É papel do coordenador reparar nas mãos no ar e avançar com a reunião, deixando o tema quente para um momento oportuno, à parte da reunião diária de acompanhamento e envolvendo apenas os participantes interessados.

9. Convidados

Pode ser interessante ter convidados (apenas como observadores, não participantes) nas reuniões diárias. Por exemplo, para dar formação a um novo coordenador, como operação de charme para promover a própria equipa ou para dar feedback, em primeira mão, a alguém interessado na evolução do projeto.

No entanto, pode haver elementos da equipa que se sintam constrangidos com a presença de convidados e a assistência de um elemento externo pode afetar o desenrolar da reunião. Sugerimos que a equipa estabeleça, tão cedo quanto possível, por votação, se permite ou não a presença de eventuais convidados.

Resumindo

Relembrámos que a agilidade nas organizações é uma questão cultural, de princípios e de valores, mas que há ferramentas, como as daily stand-ups (reuniões diárias de acompanhamento, feitas em pé), que ajudam a implementação de uma cultura de agilidade.

Vimos resumidamente o que são estas reuniões diárias de acompanhamento e que, apesar de serem uma prática essencial no desenvolvimento ágil de software, podem ser adaptadas para outras áreas de negócio.

Lançámos algumas ideias sobre como podem decorrer estas reuniões, para que possam ser lidas, interpretadas e eventualmente adotadas na sua forma de gerir, sempre com uma grande dose de bom senso.

 

Se quiser discutir em detalhe como esta prática pode ajudar a transformar a sua organização contacte-nos.

 

Photo by Eoin Gardiner on Flickr

 


 

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